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André Cavalcanti

Extremismo Político Pragmático


Os grupos de ódio anti-imigrantes atuais são os mais extremos desde o final da década de 1990 nos EUA, quando a xenofobia anti-imigração começou a subir para níveis não vistos desde a década de 1920. Esses grupos criticam os altos níveis de imigração e enfrentam ou perseguem imigrantes e seus apoiadores, e além disso, usam como principal fonte de ataque e propaganda argumentos racistas disfarçados de incompatibilidade cultural.

Alguns desses grupos acreditam em teorias de conspiração que não tem base de fato e parecem até piada, tais como: a ideia de que o México tem um "Plano de Aztlán" para reconquistar o sudoeste americano; e outra alegando que os líderes do México, Canadá e Estados Unidos estão secretamente planejando se fundir em uma entidade da União Européia que será conhecida como a "União Norte-Americana".

Esse sentimento anti-migratório tem tomado conta de boa parte dos países ricos, e decorre principalmente do aumento da desigualdade de riqueza e renda que se observa nos Estados Unidos e na União Europeia. Essa desigualdade faz com que o abismo social entre as classes de maior renda e as menos abastadas aumente cada vez mais, criando para os mais pobres o sentimento de que suas oportunidades se foram para outros países, em decorrência da globalização, e as oportunidades que sobraram foram “roubadas” por estrangeiros que se submetem a salários menores.

Não por outro motivo, populistas oportunistas como Trump, nos Estados Unidos, Le Pen, na França, e outros líderes europeus, têm discursos que mobilizam milhões de pessoas que sofrem com esse fenômeno. Para esses extremistas há dois culpados: a globalização, que leva os empregos, e os imigrantes.

Esses argumentos são falaciosos, e o fim da globalização e a restrição a imigração não trará o bem estar de volta a esses países, isso porque o que houve nas economias mais desenvolvidas foi o que os economistas chamam de desindustrialização. O termo desindustrialização é usado para se referir à redução da participação da indústria na economia, principalmente em economias avançadas. A principal indústria dessas economias não é mais a manufatureira e sim a de serviços, e principalmente de serviços que envolvem alta tecnologia. Esses serviços exigem mão de obra altamente qualificada, e não demandarão os trabalhadores que hoje radicalizam contra os estrangeiros.

Os empregos da indústria manufatureira, que deixou os países desenvolvidos em meados da década de 90, em busca de mão de obra mais barata em países emergentes, não existem mais. Americanos e Europeus médios, que viram seus empregos irem embora e aguardam seu retorno a partir das promessas de políticos extremistas e populistas como Trump terão uma grande decepção. Mesmo que se cumpra a promessa de trazer essas indústrias de volta aos países de origem, a decepção se dará ao perceberem que esses postos de trabalho foram substituídos por robôs e equipamentos de alta tecnologia. Tecnologia essa repleta de valor agregado por serviços e patentes, desenvolvidas em seus quintais, normalmente em Estados ricos como a Califórnia, cuja a politica migratória é progressista, e recebe no Vale do Silício gênios do mundo inteiro. Não à toa, o PIB desse estado norte americano atingiu em 2016 US$ 2,46 Trilhões, ultrapassando nações como Brasil e França.

A Califórnia é, mais do que qualquer outro Estado dos EUA, extremamente multiétnica: em 2015, pela primeira vez o número de hispânicos ultrapassou o de anglo-saxões. Porém nenhum grupo étnico tem a maioria absoluta da população - também há grandes comunidades asiáticas e afro-americanas. O Estado continua sendo um ímã da imigração num momento em que parte do discurso político, especialmente de Donald Trump, tenha apostado num endurecimento das políticas relacionadas a estrangeiros. Por tudo isso alguns sugerem que a Califórnia possa estar no caminho de ficar com o quinto posto mundial se o Reino Unido entrar em recessão por causa da saída da União Europeia.

Esse sentimento de xenofobia foi responsável pela saída da Inglaterra da União Europeia. O público britânico foi bombardeado com informações de como ficaria mais pobre caso escolhesse sair. Mas parece que essas informações não foram suficientes para convencê-los. Especialistas do FMI (Fundo Monetário Internacional), da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) e de várias outras organizações se pronunciaram afirmando que o crescimento econômico seria prejudicado, o desemprego aumentaria, o valor da libra cairia e as empresas britânicas ficariam em uma espécie de terra de ninguém fora do bloco. Internamente, o Bank of England levantou a hipótese de recessão e o governo afirmou que poderia ser obrigado a aumentar o imposto de renda e cortar os gastos no serviço público de saúde (o NHS), na educação e na defesa. Enquanto alguns partidários da permanência na UE admitiam que o chamado "Projeto Medo" estava indo longe demais, os defensores da saída foram rápidos em afirmar que o temor era espalhado pelas elites ricas que se beneficiavam com a globalização. Mas a opção da população pela saída do bloco sugere que muitos se sentiram fora do alcance dos benefícios econômicos dos mais de 40 anos de permanência.

Yuval Noah Harari, em seu livro Sapiens: Uma Breve História da Humanidade, sugere que após o fim dos elementos científicos que comprovavam o racismo nas décadas de 30 e 40, a sociedade ocidental passou a usar os elementos culturais dos povos como forma de discriminação e segregação. Harari usa a expressão “culturismo”. O culturismo tem sido desculpa para discriminações e políticas extremas xenófobas na Europa, principalmente contra pessoas de origem africana e do Oriente Médio.

A intolerância contra muçulmanos segue a lógica do culturismo, e é fundada principalmente na questão religiosa e no terrorismo praticado por grupos extremistas. Mas toda essa preocupação e preconceito caem por terra ao se observar o relacionamento dessas economias desenvolvidas com países árabes ricos como a Arábia Saudita, que financiam o wahabismo, uma forma messiânica e jihadista do fundamentalismo sunita.

O wahabismo promove, entre outras coisas, que mulheres sejam subjugadas e a morte aos “infiéis”. Trata-se - na descrição do ex-presidente americano Barak Obama - de uma “interpretação pervertida de Islã” e a mãe ideológica do terrorismo jihadista. Sua descendência inclui a Al-Qaeda, o Taleban, o Boko Haram, o Al-Shabab e o Estado Islâmico - todos eles misturando hostilidade aos não sunitas e um antiquado romantismo num coquetel de ódio niilista.

Apesar de todas essas evidências, na primeira viagem oficial para fora dos Estados Unidos, Donald Trump aproveitou para fechar, em Riade, Arábia Saudita, diversos contratos de venda de armas com esse país, em negócios avaliados em 110 mil milhões de dólares (cerca de 98 mil milhões de euros). Na visita afirmou: Queremos agradecer ao rei Salman e à Arábia Saudita, pelas centenas de milhares de milhões de dólares investidos nos Estados Unidos e em empregos, empregos, empregos…”.

Assim, pode-se verificar que o extremismo xenófobo é arma de manipulação contra uma população que sofre com a desigualdade social e de renda e atribui aos estrangeiros a culpa pelos males econômicos advindos de decisões políticas internas e das consequentes distorções em seus mercados.

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