Me explique aí o que é Sociedade Líquida?
Nada raro observar as pessoas interagindo no celular, sabe-se lá em que universo informacional orbitam. Estão caminhando no parque olhando para a tela do celular. Estão almoçando juntas no restaurante, mas cada indivíduo olha para seu celular. Esperam o ônibus e olham o celular. Andam na rua e..... esta caixinha acelera nossas vidas! E como!
Bilhões de informações trocadas instantaneamente e atualizadas a cada fração de segundo dinamizam nossas vidas, nossas decisões, nossas interações com os outros. Rápido, muito rápido, cada vez mais rápido. Muitas fotos, muitos crush´s, muitos matches, muitas curtidas, muitos likes. Mudando a forma como nos relacionamos com o mundo, com as informações, e com os outros indivíduos.
Refletindo sobre estas novas dinâmicas de interação que têm início na década da informação computacional, e que se tornam mais tecnológicas ao longo das últimas três décadas é que Zygmunt Bauman propõe o termo Sociedade Líquida.
Em sua visão, a característica líquida se opõe à característica sólida da sociedade, descrita por suas estruturas: a família, o trabalho, as organizações, os governos, a cultura, a identidade. Estas estruturas é que Bauman percebe e descreve na modernidade como sendo e se tornando líquidas. O líquido não tem forma, ao contrário do sólido. O líquido adquire a forma do recipiente que o abriga. E uma nova forma em um novo recipiente.
Vida líquida é uma forma de vida que tende a ser levada à frente numa sociedade líquido-moderna. “Sociedade líquido-moderna é uma sociedade em que as condições sob as quais agem seus membros mudam mais rápido do que o tempo necessário para consolidação de formas de agir” (Zygmunt Bauman. Vida Líquida, 2007).
Assim, a sociedade líquida é aquela na qual o contexto muda com tal velocidade, que, enquanto gastamos tempo nos adaptando às mudanças, novas mudanças já chegam, limitando nossa capacidade de adaptação. A vida fluida. Em constante movimento.
Mas quais são as características de uma vida líquida?
Segundo Bauman, as realizações pessoais não se solidificam em posses permanentes, é necessário rever o que se pretende consumir, com o risco de que o objeto consumido logo perca o valor e precise ser substituído rapidamente. Os Ativos se transformam em passivos com alta velocidade. As capacidades de transformam em incapacidades rapidamente. Não é recomendável aprender com experiências de vida do passado, pois estas vivências quase nada dizem sobre o futuro tão diferente. Os livros também de nada servem, pois as informações mudam antes da impressão de uma edição. As mudanças são rápidas e imprevisíveis, e, portanto, prever tendências passa a ser arriscado e quase impossível. A vida se torna esmagadoramente imprevisível gerando angústia e causando a perda de sentido de existir. Vida líquida é uma vida em condições de incerteza constante.
As novas preocupações que surgem numa vida líquida estão relacionadas à não aproveitar a fração de tempo da certeza momentânea. Não aproveitar o presente, tão fugidio. Não conseguir acompanhar a rapidez dos eventos. Ficar sobrecarregado de bens indesejáveis e perder o rumo do ‘caminho sem volta’.
Bauman inicia seu livro Vida Líquida com a seguinte epígrafe: quando se patina sobre o gelo fino, a segurança está na velocidade (do livro Sobre a Prudência, de Ralf Waldo Emerson). A vida líquida nos impõe velocidade. E a tecnologia ao mesmo tempo que nos dá velocidade, também se torna obsoleta rapidamente criando a necessidade de uma nova tecnologia conectiva para permitir a patinação mais veloz no gelo cada vez mais fino e quebradiço.
A vida líquida é uma sucessão de reinícios, e uma sucessão de finais rápidos e indolores. Esquecer o passado, sem lembrar que ele faz parte de nossas identidades para poder modelar novas identidades mais convenientes. Novas fotos, novos perfis. Livrar-se das coisas e dos sentimentos é prioridade sob adquiri-los. Apagar os relacionamentos indesejáveis nas redes sociais e criar novos vínculos tão frágeis e leves como os anteriores. Largar tudo para uma nova vida, antes mesmo de ter definido o que seria o tudo. Isto exige uma habilidade muito maior para conseguir finalizar, do que para conseguir iniciar algo. O pressuposto desta visão é o desapego e a virtualização das relações afetivas, de trabalho, as relações familiares, e de amizade.
A vida líquida é traduzida como uma história de sucessivos finais, a impermanência vale mais do que a permanência. A constância e a aderência são um perigo na vida líquida. É preciso ligar-se rapidamente e deixar ir com mais velocidade ainda. O terror é imaginar que a vida possa ficar parada. A contemplação é um passivo na vida líquida. É um lixo imaterial assim como é a história de vida, um resíduo acumulado que deve ser removido com um clique.
Tá explicado?
Perceber a sociedade como líquida, conforme propõe Bauman, significa repensar as dimensões das organizações emergentes, do consumo, do setor público, do medo, da comunidade, do amor, da família, da identidade e da cultura. Convido todos para a leitura deste incrível pensador.
Argonauta Atalanta