Na ultima reunião do COPOM a taxa básica de juros foi mantida, por unanimidade, em 6,5% a.a. A decisão foi uma surpresa para a maior parte dos analistas que esperava uma queda de 0,25 p.p. A justificativa dada no comunicado do Copom é que “a normalização das taxas de juros em algumas economias avançadas (leia-se Estados Unidos)” estaria tornando o ambiente externo (sic) mais desafiador, o que justificaria uma pausa na flexibilização da política monetária doméstica. Traduzindo: o BCB teme que uma redução muito expressiva do diferencial entre a taxa de juros doméstica e a taxa de juros americana acabe por induzir uma fuga de capitais do país, resultando assim numa grande desvalorização da taxa de câmbio e, consequentemente, uma elevação da inflação. Esse cenário seria reforçado pela incerteza eleitoral, contribuindo assim para o risco de um descontrole cambial e aceleração da inflação.
Esse receio do Banco Central me parece infundado. Em primeiro lugar, a variação acumulada do IPCA nos últimos 12 meses se encontra abaixo do piso do regime de metas de inflação (3% a.a), registrando 2,76% em abril de 2018. Já se trata do décimo mês consecutivo no qual a inflação se situa abaixo do piso do regime de metas. Mesmo quando olhamos para os núcleos de inflação, observamos que os mesmos continuaram a trajetória de desaceleração em 2018, encontrando-se atualmente em torno de 2% a.a, muito abaixo do piso da meta.
Em segundo lugar, as estimativas existentes sobre o hiato do produto mostram que a economia brasileira apresentou, na média do ano de 2017, um nível de produção cerca de 6 p.p abaixo do potencial; indicando assim a continuidade das pressões desinflacionarias ao longo do ano de 2018. Além disso, os indicadores a respeito da evolução do nível de atividade econômica estão apresentando performance muito pior do que a esperada. Com efeito, o IBC-Br, índice de atividade econômica, calculado pelo BCB, apresentou uma queda de 0,13% no primeiro trimestre de 2018 na comparação com o primeiro trimestre do ano passado. Deve-se destacar também a queda de 0,1% da produção industrial em março em relação a fevereiro de 2018, após o ajuste sazonal; quando alguns analistas esperavam um aumento de 1%. A performance abaixo do esperado de uma série de indicadores de nível de atividade faz com que as expectativas de crescimento da economia brasileira estejam sendo revistas para baixo a cada semana. O Bank of America Merril Lynch, por exemplo, reviu sua projeção de crescimento para 2018 de 3% para 2,1%.
Por fim, os indicadores de vulnerabilidade externa da economia brasileira (reservas internacionais, déficit em conta corrente como proporção do PIB, entre outros) se encontram atualmente em níveis bastante satisfatórios; de maneira que turbulências externas devem ter efeito bastante limitado sobre a taxa de câmbio.
O cenário que temos na economia brasileira hoje aponta claramente para o risco de reversão do processo de recuperação cíclica; ou seja, de um novo mergulho na recessão, ao invés do não cumprimento da meta de inflação. Sendo assim é curioso, para dizer o mínimo, o receio que a atual diretoria do Banco Central está demonstrando com relação ao quadro inflacionário. Seu comportamento se assemelha ao daqueles indivíduos que, mesmo na fase adulta, tem medo de dormir no escuro porque acreditam que tem um dragão a sua espreita debaixo da cama. Um pouco mais de coragem, ainda mais num contexto em que 27 milhões de brasileiros se encontram com falta total ou parcial de trabalho, seria de muito bom tom.
* Professor do Departamento de Economia da UnB.